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PL que revoga Lei de Segurança pode abrir nova crise entre Congresso e STF

Para o advogado e professor Georges Abboud, especialista em Direito Constitucional, STF pode rejeitar nova lei, se esta não assegurar proteção das instituições democráticas e da própria democracia constitucional

O projeto de lei que revoga a Lei de Segurança Nacional (LSN), cujo texto-base foi aprovado em votação simbólica na noite de terça-feira (04/5) pela Câmara dos Deputados, pode abrir um novo embate entre o Congresso Nacional e o Supremo Tribuna Federal (STF). É o que afirma o advogado e jurista Georges Abboud, livre-docente da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e especialista em Direito Constitucional.

“A Lei de Segurança Nacional também é objeto de exame no STF, e o plenário do Supremo pode estabelecer critérios para além ou aquém da nova lei, quando esta for aprovada no Senado”, adverte Abboud. “Neste caso, isso geraria antinomia entre STF e Legislativo”, acrescentou. Antinomia jurídica é uma contradição real ou aparente entre normas dentro de um sistema jurídico, dificultando-se, assim, sua interpretação.

O jurista aponta algumas questões técnicas que podem levar a esse impasse. “Diferentemente do que muitos pensam, a aprovação da nova lei não faria a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), invocada na análise do STF sobre a LSN, perder, de forma automática, o objeto e deixar de ser julgada”, adverte Abboud. ADPF é o termo jurídico que se refere a uma ação constitucional de competência exclusiva do STF. “Apenas alguns entes são legitimados para ajuizar uma ADPF, e algumas das decisões mais relevantes do STF são dadas nesse tipo de ação, seja em razão dos seus efeitos vinculantes, seja em razão da importância dos temas julgados”, emenda.

No caso da LSN, segundo ele, o preceito fundamental violado seria o próprio Estado democrático. “Ou seja, o STF teria de abrir mão de algo que só ele pode decidir”, esclarece Abboud, advertindo para o que está, tecnicamente, em jogo. “Ou o STF reconheceria perda de objeto da ADPFporque a lei deixou de existir, ou daria uma decisão afirmando algumas balizas essenciais ao regime democrático, as quais nem mesmo a nova lei deveria contrariar. Ou seja, se o PL da lei nova ainda estiver em trâmite, essa postura levaria uma mensagem institucional para o próprio Legislativo, na tentativa de estabelecer real diálogo constitucional entre Poderes”, afirma.

Questionado se o STF poderia reconhecer a perda de objeto da ADPF como um gesto para o Congresso Nacional, Abboud diz que é difícil prever os próximos movimentos. “Depende do conteúdo da lei que vier a ser aprovada”, diz. “Mesmo se houver a substituição da LSN, entendo que o STF pode querer declará-la inconstitucional para preservar direitos fundamentais e instituições democráticas, bem como assegurar a invalidação de atos com base na lei antiga”, afirma.

A rigor, o jurista aponta duas razões que levariam a um novo embate entre Congresso e STF em torno dessa lei. “Primeiro, ainda não sabemos o teor da lei que o Congresso vai aprovar, o que pode levar o STF a reagir para proteção de preceitos fundamentais”, diz. “Segundo, o próprio STF recentemente utilizou partes da LSN para realizar inquéritos e fundamentar decisões contra ataques ao próprio Supremo”, emenda. “Ou seja, se for aprovada uma lei desidratada, o STF provavelmente iria para o embate; e se a nova lei for desfigurada, após a publicação, pode haver nova ação a ser julgada pelo STF, juntamente com a ADPF”, acrescenta.

Apesar do possível embate entre Supremo e Legislativo, o jurista, porém, prega uma articulação visando um diálogo entre Congresso e STF para alinhar as divergências entre o que o STF não abre mão na proteção da democracia constitucional e o que o Legislativo propuser. “Tenho sido um dos teóricos no Brasil que mais defendem esse diálogo, inspirado em experiências do direito estrangeiro”, conclui Abboud.

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